Por Valdemar Morais
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Com livros ou HQs, a garantia da longevidade é não descuidar da conservação. (Fonte: Antena Cultural) |
O
dono do sebo, exageradamente relaxado numa cadeira, bebe cerveja na frente da
banca. Jovens fãs fuçam pelas prateleiras de tinta azul meio gasta, procurando
aquela edição especial do seu herói preferido, até que um deles chama pelo
proprietário. Ele se levanta rabugento, pronto para repetir seu modus operandi: olhar para a revista
solicitada e dar o preço que lhe vier à mente sem qualquer critério. Porém,
quando se aproxima, toma um susto: por trás uma pilha volumosa de livros e HQs,
uma enorme mancha marrom de cupins devora tudo pela frente.
A
cena é dantesca tanto para quem vende livros e HQs antigas quanto para quem é
colecionador. Para muita gente que lida com essas atividades, ter um acervo
volumoso e de edições raras é o que conta, mas os riscos que esse tesouro, que
realmente exige muito investimento para um ou para outro, corre, ficam em
segundo plano. O resultado desse desleixo pode ser desesperador.
Para
qualquer colecionador ou vendedor que se preze, é preciso prestar atenção aos
vilões que podem por fim àquele encadernado de luxo ou ao formatinho que você
ganhou naquela ida ao mercado quando tinha sete anos. Esses inimigos da boa
coleção podem vir de agentes físicos, químicos e biológicos.
AGENTES FÍSICOS
A
umidade e a iluminação são dois elementos físicos que, ao incidirem sobre
qualquer material bibliográfico, podem causar danos, tanto em relação à
consistência do papel quanto na facilitação do aparecimento de pragas e no
desbotamento das tintas. O uso de sílica-gel, para o controle da umidade e de
lâmpadas fluorescentes e de cortinas e persianas para o racionamento da luz
podem dirimir os efeitos desses agentes.
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Infiltrações podem danificar a consistência das páginas das HQs, bem como abrir espaço para fungos e bactérias. (Fonte: Sua Casa) |
O
colecionador também deve ficar atento a alguns aspectos físicos do próprio espaço
da coleção, tomando cuidado com o aparecimento de infiltrações e com o bom
estado da fiação elétrica, a fim de evitar o contato das revistas e
encadernados com a água e o risco de curtos circuitos e um possível incêndio.
Ademais,
outros materiais que vez por outra são colocados em contato com as edições
também podem trazer prejuízo. Utilizar clipes, grampos ou fita adesiva para
remendar as revistas é fatal, pois no envelhecer desses materiais, eles
terminam manchando e danificando as páginas. A mesma proibição vale para o uso
de plásticos – adesivo ou não- para encapar as HQs comuns ou seus encadernados.
AGENTES QUÍMICOS
No
que tange a agentes químicos, a poluição atmosférica e ambiental é certamente o
mais agressivo deles em relação a um acervo de HQs, pois a temida poeira – que
abriga diversos compostos como óxido de carbono, enxofre e nitrogênio- pode se
agregar à celulose das publicações e no processo causar a deterioração de capas
e páginas. Manter os materiais em sacos plásticos – com as bocas abertas, sem
adesivos, dobradas- garante a proteção contra esses agentes.
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Sacos plásticos, encontrados em lojas especializadas ou mesmo aqueles de supermercado, preservam as publicações dos efeitos do ar poluído. (Fonte: Pipoca & Nanquim) |
AGENTES BIOLÓGICOS
Os
agentes biológicos, representados principalmente pelas pragas, são certamente o
maior dos terrores de vendedores e colecionadores. É aqui que eles encontram
seus mais ferrenhos inimigos.
- Insetos
Traças,
baratas, brocas e cupins são insetos capazes de literalmente levar um acervo
inteiro a baixo. As traças, por se alimentarem da celulose, tem um apetite voraz
sobre o papel e podem despedaçar páginas se conseguirem ter acesso às
publicações; Baratas também podem avançar sobre as revistas se forem conduzidas
por resíduos orgânicos, como restos de comida; Mais agressivas até do que as
traças, as brocas de madeira se instalam desde jovens em materiais com celulose
e na medida em que crescem, sua fome e voracidade aumentam, destruindo tudo que
encontram. Diferentemente dos cupins, com quem são geralmente confundidas, as
brocas não vivem em sociedade, são independentes; Por sua vez, os cupins, sejam
os de madeira seca ou os de solo, quando infestados numa coleção, levam
qualquer um ao pânico. Para que uma tragédia como essa ocorra, basta um
ambiente úmido, cheio de celulose impregnada com microrganismos.
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Até a cola utilizada na produção dos encadernados, por exemplo, pode atrair as asquerosas baratas. (Fonte: Superinteressante) |
Felizmente,
quando descobertos precocemente, todos esses insetos podem ser eliminados com o
uso de produtos químicos, que devem ser aplicados por profissionais
especializados em dedetização, de maneira que os “venenos” aplicados não afetem
também o acervo.
- Microrganismos
Manchas extensas nas páginas são o sinal patente da contaminação por fungos. (Fonte: Arquivo Histórico de Porto Alegre) |
Fungos
e bactérias também promovem entes que atacam a celulose. Como ambos se
proliferam especialmente em locais úmidos, pouco arejados e com temperaturas
altas, é extremamente válido se precaver contra esses elementos, mantendo o
espaço da coleção sempre limpo, livre de contato com água e com climatização controlada.
No caso de acervos já atacados, mais uma vez se faz necessária a consulta à
assistência especializada, que fornecerá produtos químicos para extinguir a
infestação.
- Roedores
Embora
não consumam celulose, os ratos e seus semelhantes também geram dor de cabeça a
quem quer preservar suas HQs. Esses bichos, fonte de um sem número de moléstias
para o ser humano, usam o papel para se aquecer e como matéria-prima de seus
numerosos ninhos. Contra eles, valem as mesmas recomendações dadas em relação a
insetos e microrganismos, tanto para evitá-los quanto para exterminá-los.
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Num acervo sujo, mal ventilado e desorganizado, os ratos literalmente fazem a festa. (Fonte: Olhares) |
- Pessoas
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Definitivamente, esse não é o melhor lugar pra qualquer coleção. (Fonte: Meu Rascunho de Ideias) |
Todas
as pragas citadas anteriormente surgem pelas atitudes desorganizadas dos
próprios seres humanos. Muito frequentemente, colecionadores principiantes,
amigos inconsequentes, familiares insensíveis cometem verdadeiras atrocidades no
trato com os quadrinhos e depois não sabem por qual razão aquela edição mais
que especial virou só restos. Comer ou beber durante a leitura, mexer nas
revistas ou nos encadernados com as mãos suadas ou sujas, dobrar as publicações
até unir as capas, amassar ou dobrar páginas, riscar ou escrever nas edições,
usar clipes, grampos ou adesivos são algumas das atitudes que podem contribuir
para encurtar a vida da sua coleção.
Ou
seja, manter o santuário das suas HQs sempre limpo, arejado e bem organizado é
fundamental!
Fonte
- Técnicas Básicas de Conservação e Preservação de Acervos Bibliográficos, de Joana Paula Coradi e Gisela Eggert-Steindel;
- Brocas em Dedetizadora Ilha;
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